quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Como fazer de seu jotacá uma cabana na floresta - tomo 16

Foi por literatura que não me afundei no teu pescoço e morri na gola da tua camisa, foi por amor a Mário, Carlos, Julio, Clarice (os amores possíveis), foi por letras de Renato, por páginas de Florbela, por sussurros de Gullar, esse meu nobre pobre amigo de agosto, foi pelo mês de agosto que não sucumbi a teu rosto pequeno mas teu rosto no canto da tela - ausência tua, bastava uma tecla minha. Foi por literatura, por essas infâmias, foi por nossas estranhas maneiras de comportamento, foi por um belo instrumento de fala, foi porque tenho agora a fala rala, porque hoje não é novembro, porque chove, porque parou de chover, porque na foto o céu é sempre azul e liso engomado no ferro a vapor, que literatura, que palavras duras chegando a pontos finais, o ponto marcado, o encontro. Foi por querer Hilst e dormir com Andrade, acordar suada, os tapetes peludos e a cara aberta do Ferreira no retrato, foi por te amar de quatro, por feder a minha blusa e por não saber mais (perdendo os traços de Beatriz) como é o beijo do teu beijo que tocou minha boca que beijou a tua e te deu o beijo. Foi por literatura, pelo capítulo sete, foi pela esquina de nazca com aquela outra, foi porque pensei e se eu tivesse ido com o garçom do restaurante ao lado do teu prédio naquela tardezinha?, ah, foi por literatura, vai, porque era teu o sorriso irônica a covinha o doce dentro do ouvido fazendo perfume na praça, foi por correr nua ao lado do cavalo que soltaste das correntes aos dois graus e meio, a tevê ligada, a senhora chorando na portaria, os casais entrando contentes, mais contentes ainda saíam, foi pelos hífens que eliminaram da ortografia, pelos sanduíches de miga no Rivadavia, pelas migalhas que se produzem entre a noite e o dia, pelas tardes de trem, preguiça, uma poltrona aberta com o teu corpo dentro, teus olhos voltados pro firmamento, uma porta arrancada, às pressas, teus vazios na escada, a massa morta de mim ao lado do gato, os berros de que não fui eu, a esteira, (Bersuit nos alto-falantes anunciava a partida, minha, para a terra, de ninguém, no acaso. Ia, pelo bem).

[Para ler com voz de Elisa Lucinda ou pedir pra ela ler, se chegar perto]

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